O IRLANDÊS – Forma e Conteúdo Em Um Épico da Sétima Arte
Quando enfim consegui terminar de ver esse filme após 3 dias, ignorando a orientação de alguns críticos que recomendaram assisti-lo direto e sem pausas, confesso que titubeei, por alguns momentos não me senti capaz de discorrer sobre uma obra de tamanha maestria, Martin Scorsese talvez tenha entrado para um seleto grupo de entidades artísticas capazes de contar histórias tão ricas e repletas de detalhes e particularidades. Talvez eu tivesse que viver mais umas duas décadas para encontrar palavras e termos capazes de definir algo tão grandioso, mas enfim, vamos fazer isso da maneira mais modesta possível. E antes que você caro(a) leitor(a), fique ansioso(a) para a possibilidade de algum spoiler desse filme, pode se tranquilizar, pois o texto a seguir não tem a menor intenção de revelar qualquer detalhe que comprometa sua experiência ao assistir esse magnífico longa metragem.
O filme acompanha a história de Frank Sheeran (Robert de Niro) conhecido como “O Irlandês” ex combatente condecorado e com uma forte predisposição a criminalidade, que após se envolver com gângsters e demonstrar frieza e índole questionável, é recrutado por um chefe de uma família de criminosos, Russell Bufalino (Joe Pesci) que o contrata como seu “personal killer” e ele então vai acompanhar a família Bufallino ao longo de muitos anos. Al Pacino também empresta de forma poderosa sua atuação para reviver os dias de Jimmy Hoffa, um dos líderes sindicais mais influentes nos EUA, nas décadas de 50 e 60 e sua conturbada relação com mafiosos. Basicamente esse é o tripé fundamental do filme, três histórias, três personagens e várias vidas e muitas histórias interligadas.
O filme dispõe de 3h30min para contar todas essas histórias, é um filme difícil, lento, com falas e diálogos na sua maioria simples, mas que pavimentam um caminho que vai te lavando aos poucos, por etapas, recortes, e intimidades interessantes demais para não serem consideradas, têm suaves pitadas de humor, leveza em suas amplas cenas e momentos intimistas, mas que volta e meia nos arrebata com violência, crueza e apatia.
Se o enredo é o caminho a ser percorrido, a trilha sonora é o fio condutor, o motor que impulsiona o avanço da trama, é aquela trilha que você vai querer ouvir por dias depois de assistir ao longa, pois ela é quem revela, desnuda e abraça nossos sentidos, e que não por acaso está prontamente situada em cada cena, em cada mudança, em cada momento trágico, no suspense e na tensão de cada uma das decisões e rumos tomados na trama.
Esse certamente é um daqueles filmes que fala muito sobre escolhas, e como o tempo, implacável, cobra de forma impiedosa de cada um de nós cada passo e decisão, acertada ou inconsequente, os momentos finais são carregados de melancolia, e talvez melancolia seja o que define bem toda a trajetória de nosso irlandês, talvez Scorsese do alto de seus 77 anos tenha imprimido de maneira irrestrita cada pequena barreira que o tempo e a idade nos impõem, e quando o impenetrável e soberbo Russell (Pesci) percebe que muito de sua autoridade e virilidade se perdeu ao longo das décadas, é que somos alçados as mais profundas reflexões, por vezes incômodas, e quase sempre indigestas.
Talvez essa tenha sido a última vez que vimos três dos maiores atores do cinema (De Niro, Pesci e Pacino) sendo dirigidos por um daqueles que certamente é um dos maiores cineastas do mundo. O Irlandês não é só mais um filme de gangster, é um filme sobre a vida e a alma de Scorsese, é um filme que condensa de forma requintada todas suas particularidades já mostradas em Os Bons Companheiros (1990) e Cassino (1995) é um filme além e ao mesmo tempo fora de seu tempo, que provavelmente não encontra espaço nos blockbusters de hoje, é um filme que tem forma, conteúdo e que de tão audacioso rompeu com o habitual, quebrando o paradigma das salas de cinema, sendo exibido em um canal de streaming que também apostou alto e abraçou o projeto.
Certamente essa é uma daquelas superproduções que vão ficar na história, um clássico já na sua concepção, um marco cinematográfico, um presente, que irá servir pra sempre como fonte de inspiração, para as futuras gerações.
Por Ricardo França
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